Reportagem Swans no Porto
Os titânicos Swans, casa forte da música experimental com inclinações para o rock, voltaram poucos meses depois à cidade que os aplaudiu durante o NOS Primavera Sound. O último canto de cisne da actual formação da banda deu-se no passado dia 8 no Hard Club, um domingo, dia mais do que adequado: afinal, ir a um concerto de Swans em tudo se assemelha com um ritual religioso. Que tem mais de profano do que divino.
E a sala 2 bem que se foi compondo, à medida que a hora do concerto se aproximava. Para os exercícios de aquecimento, os presentes tiveram a sorte de ser agraciados com a excêntrica presença de Baby Dee, artista transgénero com um sentido de humor refinadíssimo. Sentada e tocando o seu acordeão, fez questão de sublinhar que se tratava dum acto familiar (afinal, o seu sobrinho acompanhava na guitarra), e durante cerca de meia hora espalhou a sua folk cheia de mitos, demónios e bruxas. No ouvido, ficou a brilhante “So Bad”, onde os versos “Jesus got my Mom in there / and beat her up so bad / he beat her up so bad” são repetidos ao longo do tema. É fácil entender o porquê das colaborações e amizades com outros músicos alternativos de renome como Anthony and the Johnsons, Marc Almond ou Dresden Dolls: Baby Dee é uma artista de mão cheia, com um encanto particularmente grotesco, mas que combina perfeitamente com o seu universo.
Mas os nervos traiam os sorrisos, e era notório alguma ansiedade em acolher, de novo, Swans: São possivelmente uma das bandas mais desconcertantes que se pode ter o prazer de ouvir, onde as convenções mais presentes na música são abaladas e dobradas a bel prazer dos seus executantes. Seriam cerca das 21h20 quando deu início o concerto, num quase desfilar sem parar de tema atrás de tema. E já que abordamos os temas, estes foram, à semelhança dos restantes concertos, os mesmos 5, o que é bastante comum nas suas tours.
Arrancou com “The Knot”, tema apenas presente Deliquescence, álbum gravado ao vivo durante a tour deste ano, é uma viagem entre o céu e o inferno, onde a guitarra parece varrer com ondas a costa onde nos encontramos. É um tema longo, longo o suficiente para nos levar a vários mundos e estados, e “Screen Shot”, com a sua entrada hipnótica de baixo, muda logo a agulha e de repente estamos perdidos, num deserto, enfeitiçados pelas palavras de Michael Gira. Apesar do trabalho notável de todos os músicos, é difícil ficar indiferente à qualidade de Phil Puleo atrás da bateria, conseguindo dar a consistência necessária ao caos aparente que figura nas músicas de Swans.
O início trepidante de “Cloud of Uknowing”, de Tne Glowing Man, leva o público a um abanar de cabeça bem doom, enquanto “The Man Who Refused to Be Unhappy”, que à semelhança de “The Knot” nunca tinha sido editado antes, baralha os ouvidos com o seu início repetitivo e crescendo demorado mas eficaz, como se de uma longa viagem de carro se tratasse: é talvez que sofre de menos alterações e mudanças de direcção. Para rematar, “The Glowing Man”, que após um início letárgico de distorção, nos coloca num lugar mais familiar do rock e onde a classe e a mestria do projecto é notória: num só tema, praticamente todos os sub-géneros alternativos do rock se encontram lá.
É nessa sempre difícil definição que os Swans se despedem da sala, sem grandes artifícios, conversas ou falsidades: afinal, na missa quem manda é o padre.
- Organização:Amplificasom / Uguru
- terça-feira, 02 janeiro 2018